UNO Setembro 2016

Triatlo cubano, muito esforço, mas as coisas estão mudando

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Uma competição desportiva em Havana converteu-se no melhor reflexo da realidade cubana após a visita de Obama

In Cuba Today é uma edição digital do Miami Herald sobre notícias da ilha. Cultura, política e negócios são as principais seções da publicação, que serve como fonte de informações para a comunidade cubana no sul da Flórida e, especialmente, para as empresas norte-americanas cada vez mais interessadas ​​nas circunstâncias da ilha. Em junho, o In Cuba Today informou os planos de uma empresa de capital de risco, com sede em Miami, de investir em vários eventos desportivos realizados na ilha.

Entre eles está o cada vez mais popular Triatlo de Havana, que reúne, anualmente, atletas de todo o mundo, atraídos por uma competição que percorre os locais mais emblemáticos da capital caribenha. Como nesse esporte olímpico, a normalização das relações entre Cuba e os EUA, assim como a abertura do país ao investimento estrangeiro, está sendo uma longa corrida, cheia de obstáculos, ao alcance apenas de profissionais bem preparados e com fôlego, que acreditam no médio e longo prazo.

As aberturas políticas, sociais e econômicas do país parecem estar caminhando, em velocidades distintas, em direção aos cidadãos, empresas e governos de ambos os países

Essa iniciativa desportiva é o melhor reflexo de um processo iniciado em dezembro de 2014. A partir de duas coletivas de imprensa coordenadas, Barack Obama e Raúl Castro anunciaram ao mundo a normalização das relações diplomáticas entre os dois países. Assim, nos últimos 12 meses foram produzidos marcos de grande relevância histórica, que não devemos deixar de destacar: a abertura das embaixadas em ambos os países, a suspensão das restrições de viagem para cidadãos norte-americanos e a visita de Obama à ilha, a primeira de um presidente dos Estados Unidos desde 1928. São alguns dos sinais mais evidentes da normalização bilateral das relações.

Enquanto elementos como o embargo econômico apenas podem ser deliberados pelo Congresso Americano, uma oposição de importantes legisladores, uma pequena, mas forte comunidade cubana contrária a qualquer concessão ao regime castrista, assim como parte da oposição interna cubana impõem obstáculos à normalização nas condições atuais. As aberturas políticas, sociais e econômicas do país parecem estar caminhando, em velocidades distintas, em direção aos cidadãos, empresas e governos de ambos os países, e isso parece ser difícil de parar.

O tradicional engenho cubano, unido a essas novas oportunidades, faz com que, em muitas ocasiões, o setor privado se mova mais depressa do que a legislação atual e os governos vigentes

Após a expectativa internacional, a atenção da mídia e os marcos mais simbólicos dessa normalização, a realidade política da ilha tem mostrado sua dinâmica tradicional. Para analistas que se debruçam sobre Cuba, o anúncio de que Raúl Castro permanecerá como líder do Partido Comunista até 2021 foi como um balde de água fria nas expectativas de mudanças mais otimistas. As faces mais jovens do Partido Comunista, como o vice-presidente Miguel Díaz-Canel, deverão esperar sua oportunidade para relevar os octogenários comandantes da revolução, cuja aposentadoria se dará mais por questões geriátricas que por dinâmicas de mudança política ou pressão popular. Membros da sociedade civil e jornalistas independentes também seguem sem obter o espaço que reivindicam na ilha.

010_1Mas vamos observar como algumas reformas de abertura no setor privado cubano foram anunciadas para melhorar as condições dos trabalhadores independentes e microempresários que começam a surgir com mais vontade do que recursos. A tradicional engenhosidade cubana, unida a essas novas oportunidades, faz com que, em muitas ocasiões, o setor privado se mova mais depressa do que a legislação atual e os governos vigentes.

Primeiro, com o objetivo de melhorar a formação e as possibilidades desses empreendedores, várias universidades americanas estabeleceram acordos de colaboração. A Universidade Internacional da Florida, a FIU, em sua sigla em inglês, desenvolveu o programa InCubando@FIU. Na primeira promoção desse programa, composto por 15 empresários cubanos, estes passaram seis semanas recebendo aulas na escola de negócios da FIU, em Miami. Maior mobilidade dos cidadãos da ilha, de turistas internacionais e novas vias de colaboração da sociedade civil geram oportunidades desconhecidas até hoje para uma sociedade ávida por mudanças econômicas e políticas.

Em segundo lugar, os cubanos estabelecidos no sul da Flórida que visitam seus familiares carregam em suas malas de viagem, além de produtos difíceis de encontrar na ilha, suprimentos para negócios familiares e empresariais. As cadeiras e mesas em Cuba são reparadas com pregos Home Depot, uma grande marca de bricolagem americana. O embargo se curva à engenhosidade e habilidade dos visitantes em uma ilha cada vez mais porosa às tendências do exterior.

Em terceiro, a primeira multinacional americana já opera verdadeiramente na ilha, já que hoje, na web, o Airbnb tem disponíveis mais de 300 imóveis de aluguel, de Havana até Baracoa. Desde apartamentos no centro histórico de Cienfuegos, até casas à beira-mar em muitas das praias da ilha. Essa realidade digital, muitas vezes subterrânea, é uma janela para o empreendedorismo de muitos cubanos, que, sem acesso à internet, encarregam familiares e amigos de fora do país de fazer a gestão de seus aluguéis.

Em quarto lugar, o fim da sétima temporada de Game of Thrones começou a ser exibida em Havana apenas algumas horas depois de haver estreado nos EUA. Em outras das engenhosidades habituais, grupos de jovens conectados fizeram download da série no computador e circularam uma memória portátil, conhecida como el paquete, pelas ruas de Havana, fazendo centenas de cópias, em resposta às restrições de acesso à Internet na ilha. O último fillme de Spielberg ou a nova série do Netflix estão disponíveis nesse comércio analógico de conteúdos digitais, logo após um adolescente em Chicago ou Nova York vê-los na HBO.

Esses e outros marcos de empreendedorismo, nascente iniciativa empresarial e novas formas de negócios criadas nas ruas do país, em vez de nas altas esferas, em ocasiões às vezes pouco conhecidas, mostram que muitas das mudanças em curso em Cuba estão longe da atenção da mídia.

Quando o próximo triatlo tiver início fevereiro, em Havana, mais atletas nacionais e internacionais participarão desse teste de resistência pelas ruas da capital cubana. Nas provas de triatlo, como ocorre na abertura econômica de Cuba, depois de deixar a água, é preciso percorrer vários quilômetros em bicicletas e outros tantos correndo. Prova ao alcance apenas dos atletas mais bem preparados e mais resistentes ao teste. Nós, como companhia, já estamos fazendo parte dessa corrida, e aprendendo como é possível participar das oportunidades que já estão abertas, mas especialmente daquelas que estão por vir.

Hoje, somos todos um pouco mais cubanos.

Alejandro Romero
Sócio e CEO para as Américas da LLORENTE e CUENCA
Desde 1997 está à frente do processo de expansão da companhia na América Latina, iniciando as operações do Peru, Argentina, Colômbia, Panamá, Equador, México e, recentemente, Miami. Romero também liderou os processos de comunicação de três das dez operações de M&A mais importantes na região: a venda das operações da BellSouth ao Grupo Telefónica, a aquisição do Grupo Empresarial Bavaria pela SABMiller e a venda do Grupo Financeiro Uno ao Citibank. Em 20 anos de trajetória, conseguiu posicionar nossa companhia como a primeira rede de comunicação da América Latina. [EUA]

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