UNO Maio 2022

Uma recuperação econômica sinuosa: otimismo e ameaças externas

Todo mundo tem um plano até que recebe um golpe na cabeça. Esta famosa frase de Mike Tyson parece ressoar nesses tempos de incerteza e ameaças externas. Primeiro, a Covid-19 tergiversou a economia mundial e pôs de joelhos às cadeias mundiais de valor, a política econômica, os preços das commodities, etc. Foi um shock de oferta e demanda que poucos conseguiram esquivar. A resposta a nível mundial veio da mão de estímulos fiscais—para os países que puderam fazê-lo— uma política monetária expansiva e pacotes de ajuda, trazendo consigo consequências de longo prazo que ainda estão por vir.

Logo, do ponto mais alto da emergência na área da saúde, algumas economias conseguiram crescer sem chegar, todavia, a recuperar ainda seus níveis prépandemia. Porém, a incerteza regressou no final de 2021 pela onda de novas variantes. Um breve vislumbre de recuperação voltou a desacelerar no início de 2022, com os efeitos econômicos da invasão russa a Ucrânia. A ansiada recuperação, mesmo que ainda visível, não será sem um alto grau de resiliência para os planos de qualquer nação, empresa ou governo, e o escorregadio crescimento terá que assentar-se em pilares sólidos para não voltar a cair.

Sem dúvida, não podemos esperar resultados distintos fazendo sempre o mesmo e muito menos em ambientes mutantes como os atuais. No Equador, um país de onde, por muito tempo, se enviaram sinais equivocadas ao mundo, se afugentou a investimento, se ameaçou não pagar as dívidas e de fato cumpriu, hoje se oferece um panorama diferente encaminhado a recuperar a credibilidade nacional e internacional, assim como gerar um marco que abra a porta para transformações em matérias econômica e financeira.

O Banco Central do Equador espera que o investimento aumente 4,9% em 2022 impulsionado por uma maior injeção de capitais nos setores petroleiro e mineiro.

A partir de uma perspectiva econômica e, dadas as limitações que tem o Equador em comparação com sua política monetária—a moeda oficial é o dólar americano, pelo que não é possível imprimir dinheiro para dinamizar a economia. Há quatro fatores que estão potencializando a recuperação econômica do Equador em 2022: a evolução do crédito, o preço do petróleo, o acesso a financiamento externo e a atração de investimentos.

A função do crédito na recuperação

A dinamização do crédito em 2021, que se acelerou quando as atividades econômicas puderam reabrir, é uma das principais razões para o melhor desempenho econômico alcançado em 2021 e as expectativas deste ano. Nesse contexto, mais de 6,9 milhões de novas operações de crédito foram desembolsadas pelos bancos privados entre janeiro e dezembro de 2021, isto é, 13% a mais que em 2020 (790.000 operações adicionais).

Neste período, os bancos colocaram 25.551 milhões de dólares em novos créditos, o que representa um incremento de 9% frente a 2020 (2.116 milhões adicionais), de acordo com as cifras oficiais. Estas cifras evidenciam o apoio do setor bancário ao país no processo de recuperação. Colocar novos créditos aos setores produtivos e às famílias equatorianas permitiu manter e ampliar negócios, gerar mais emprego, dinamizar a produtividade e alavancar a recuperação econômica. Além disso, sete de cada dez dólares de novos créditos entregados entre janeiro a dezembro de 2021 destinaram-se aos setores produtivos (microcrédito, vivenda, empresas e PMEs).

Nos dois primeiros meses de 2022, os novos créditos crescem a um ritmo de 21% anual e o crédito que maior crescimento apresenta é o microcrédito com um incremento de 50%. Há dois anos do início da pandemia, os bancos privados equatorianos se encontram sólidos e continuam acompanhando a reativação através da colocação de créditos, o que contribuiu à recuperação da produção, geração de emprego e reativação do consumo no país.

O Equador fechou fevereiro 2022 com uma inflação anual de 2,71%, enquanto o Peru o fez em uma de 6,1%, e a Colômbia em 8%, a maior do último lustro.

Preço do petróleo

Os preços do petróleo mantêm uma expectativa de subida devido aos recentes acontecimentos na Ucrânia, mantendo o barril acima dos 100 dólares. Para o Equador isso tem duas caras. Por um lado, significa maiores ingressos para o Orçamento do Estado, mas, por outro lado, tem um efeito no encarecimento de derivados de petróleo e outros produtos. O Equador fechou fevereiro 2022 com uma inflação anual de 2,71%, enquanto o Peru o fez em uma de 6,1%, e a Colômbia em 8%, a maior do último lustro. É vital mencionar que o país deve aproveitar a conjuntura do preço de petróleo, mas antecipar uma transição energética progressiva na direção renovável.

Acesso a financiamento

A possibilidade de retornar aos mercados internacionais com emissão de bônus significa para o país a opção de ter fontes adicionais de recursos para o financiamento de obras e projetos. A última vez que o Equador emitiu bônus soberanos foi em setembro de 2019. A aprovação de mudanças normativas em matéria tributária, investimento e emprego, assim como cumprir com o acordo com o FMI e as ações tomadas em matéria de reformas apresentam um cenário favorável para retornar aos mercados potencialmente em 2023.

Investimento

O Banco Central do Equador espera que o investimento aumente 4,9% em 2022 impulsado por uma maior injeção de capitais nos setores petroleiro e mineiro. Para conseguí-lo se apresentam vários mecanismos para fortalecer a investimento, que no segundo trimestre de 2021 alcançou somente 1,1% do PIB.

Espera-se que a Assembleia aprove o projeto para atrair investimentos que pretendam reformar a Lei de Alianças Público-Privadas, melhorar o marco normativo para as zonas francas e dinamizar o mercado de valores. Outra estratégia para atrair investimentos é a redução do Imposto para saída de divisas, passando de 5% a 4%. Outra meta é alcançar maior abertura ao investimento privado no setor petroleiro. Pretende-se delegar contratos de participação, onde a empresa privada investiria em troca de obter uma porcentagem da produção petroleira.

Finalmente, o Equador procura concretizar 10 tratados com mercados considerados estratégicos. O mais próximo é um acordo com o México para formar parte da Alianza do Pacífico em 2022.

O impacto se observa pelo encarecimento de importações de matérias primas agrícolas principalmente de abonos e fertilizantes, já que 38% destes produtos foram importados da Rússia em 2021

Apesar destes quatro elementos favoráveis, o Equador tem grandes desafios para navegar em 2022. A nível interno, é imperativo alcançar os acordos necessários para a governabilidade do país. Em matéria externa, o desafio mais latente é o impacto do conflito bélico que deixa sequelas para todos. No caso equatoriano se traduz em menores exportações de banana, camarão, flores, pescado e café que, em 2021, representaram 1.129 milhões de dólares para a área afetada (Rússia, Ucrânia, Armênia, Cazaquistão e Quirguistão). Também o impacto se observa pelo encarecimento de importações de matérias primas agrícolas principalmente de abonos e fertilizantes, já que 38% destes produtos foram importados da Rússia em 2021. Além disso, com a valorização do dólar, o país terá menor competitividade em mercados internacionais.

A economia equatoriana, da mesma forma que muitas outras, deverá estar preparada para saltar obstáculos em um caminho sinuoso e, apesar de contar com boas perspectivas, procurar alternativas ante um ambiente incerto.

Andrea Villareal
Diretora do Departamento Econômico na Associação de Bancos Privados do Equador (Asobanca).
Mestre em Administração Pública em Economia e Políticas Públicas por The London School of Economics and Political Science (LSE), Mestre em Finanças e Gestão de Riscos na Universidade Andina Simón Bolívar (UASB), Especialista Superior em Finanças (UASB) e é Economista pela Pontifícia Universidade Católica do Equador. Atualmente é Docente de Entorno Econômico e Macroeconomia no IDE Business School e Diretora do Departamento Econômico na Associação de Bancos Privados do Equador (Asobanca).

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