A inovação requer diversidade… e coragem
Desde pequenos fomos formados e educados para pensar de determinada forma. Quando escolhemos uma carreira, também decidimos (embora talvez inconscientemente) um modelo mental e uma forma particular de pensar e de atuar: a influência dos nossos pais, do nosso grupo de pertença, o êxito e o fracasso profissional da nossa família, as aulas de ténis, as lições de inglês ou de piano.
Tudo o que fizemos nos leva à inevitável conclusão de que somos o que pensamos. Gosto de definir a inovação como a capacidade de fazer as coisas de uma forma diferente, mas com um propósito. Poderia aceitar que é mais ou menos fácil definir um objetivo. Mas mudar, pensar de maneira diferente, fazer as coisas de outra forma, é simplesmente lutar contra anos de hábitos aprendidos.
É por isso que, quando gostamos da mudança e da transformação, nos resulta tão atraente qualquer exercício que nos ajude a sair da nossa zona de conforte. Entusiasma-nos o desafio de ter que deixar de lado o pensamento linear, para procurar caminhos alternativos, para chegar talvez ao mesmo fim, ou a um final inesperado.
Mas não poderia afirmar que isso é a inovação, pelo menos no seu estado mais puro. A inovação também não está subjugada à quantidade de termos inovadores que podemos memorizar ou às vezes que repitamos que somos inovadores. Afirmar que somos disruptivos porque empregamos big data ou Inteligência Artificial numa oração, explicar-lhe a alguém que o futuro é a tecnologia, ou preparar uma apresentação sobre a transformação do mundo do trabalho é mais bem um mecanismo de sobre-adaptação para evitarmos sentir-nos alheios a uma realidade que provavelmente não terminamos de compreender.
“Escutar e observar quem pensa diferente é descobrir que o universo tem limites mais distantes, e observar uma equipe é descobrir que os limites são invenções próprias do sesgo que gera o ser como somos e pensar como pensamos”
Ninguém quer permanecer no passado, ou reconhecer que se sente cómodo ali. Mas o problema é que, mais além de qualquer esforço que realizemos para nos aproximarmos da inovação, nunca conseguiremos realmente chegar a resultados diferentes se não formos capazes de pensar diferente. Provavelmente cheguemos ao mesmo final, com alguns matizes no caminho.
Passo a lustrá-lo do seguinte modo: poderia escrever 10 vezes este texto, parafrasear cada linha, tentar escrever de noite ou de dia. Talvez conseguisse que fosse algo diferente. Mas, no fim de contas, o resultado seria o mesmo. O efeito que as minhas palavras provocam no leitor não seria muito diferente. Não quero dizer com isto que não possamos aprender, mas sim que somos o que somos, e deveríamos aceitá-lo sem reservas. Só assim seremos capazes de começar a entender que o efeito que podemos provocar é limitado, e está restringido a como pensamos, e que a mudança, profunda e verdadeira, chega quando somamos algo que não possuímos.
Art Fry, um químico da 3M, no final dos anos 60, costumava cantar ao domingo no coro da sua igreja. Para separar as páginas do livro de salmos, utilizava pedacinhos de papel que, ao abrir o livro, acabavam por cair ao chão. Um dia recordou-se que o seu colega Spencer Silver tinha inventado uma cola tão má que não servia para colar, e foi descartada pela companhia. O problema era que se descolava facilmente, sem sequer danificar o papel ou deixar vestígios. Fry começou a experimentar aplicá-la aos seus papéis separadores, tornando-os autoadesivos. Essa foi a origem dos Post-It, que deu lugar a perto de 4000 produtos derivados, comercializados por 3M.
Uma pessoa talentosa e capaz tem enormes chances de realizar grandes coisas, mas nada comparado com duas pessoas talentosas e capazes, e menos ainda com uma equipe. O maravilhoso de integrar perfis diversos é ver como o mundo se amplia. Escutar e observar quem pensa de maneira diferente é descobrir que o universo tem limites mais distantes, e observar toda uma equipe é descobrir que os limites são invenções próprias do sesgo que gera sermos como somos, e pensar como pensamos.
“Uma pessoa talentosa e capaz tem enormes chances de realizar grandes coisas, mas nada comparado com duas pessoas talentosas e capazes, e menos ainda com uma equipe”
Não existe motivo para pensar que as possibilidades são limitadas, que apenas existe o que conhecemos ou compreendemos. Experimentem colocar um engenheiro a conversar com um pintor sobre a origem do universo. Ponham esse engenheiro a pintar, ou esse pintor a calcular a resistência de um material. Não sei se algum deles terá êxito, mas isso é o que menos importa.
A inovação não deveria ser um propósito, e sim um meio. Os que nos dedicamos à comunicação, e contribuímos para a profissão desde alguma área deveríamos animar-nos a juntar numa mesa de trabalho perfis tão diversos como peritos em dados, developers e psicólogos, jovens e pessoas experimentadas, principiantes e especialistas, apaixonados e céticos. Já sabemos o que fazer quando um cliente nos chama, o que não sabemos é tudo o que ainda temos para aprender.
Sem perfis diversos nunca confirmaremos se aquela ideia que temos em mente, ainda difusa, é possível, até a contrastarmos e a provarmos. A inovação é um bálsamo que pode nos reconfortar da monotonia, do esgotamento ou do excesso de responsabilidade. Mas para inovar é preciso coragem. É preciso aceitarmos que podemos sentir-nos incómodos. Tolerar que desafiem as nossas crenças. Enfrentar os nossos piores receios. É um processo árduo, difícil, sinuoso. Mas, no final, é tão positivo descobrir que não há limites, que somos verdadeiramente livres, que vale a pena cada minuto desse percurso.
Ponha uma equipe de gente diversa a trabalhar, dê-lhes um propósito, e a inovação estará garantida.
“A inovação também não está subjugada à quantidade de termos inovadores que podemos memorizar ou às vezes que repitamos que somos inovadores”